Rute Ester dos Reis
Lana de Castro Siman

AVALIAÇÃO PEDAGÓGICA COMO RECURSO PARA O PLANEJAMENTO ESCOLAR.
O paradigma da escola inclusiva nos coloca frente a alunos que apresentam as mais diversas necessidades educacionais, e para as quais as escolas vêm se preparando para atender.
O trabalho educacional com os alunos que apresentam graves comprometimentos sóciocognitivos torna-se um desafio, pois, muitas vezes, eles não apresentam respostas às demandas do nosso planejamento pedagógico. E nos perguntamos: "Como trabalhar com este aluno?" "Ele é capaz de aprender, como os outros?" "O que vou ensinar a ele?".
A escola, às vezes, se baseia de forma equivocada nestas limitações para dividir os alunos em turmas homogêneas, desconhecendo as diferentes faixas etárias, seus interesses, a bagagem de conhecimentos e experiências que cada um traz consigo. E corre o sério risco de subestimar a capacidade de aprendizagem e de produção intelectual dos alunos. As teorias psicogenéticas e sócio-interacionistas estudadas na unidade anterior, vieram contribuir para o trabalho pedagógico, na mudança da condução do processo de ensino e aprendizagem - centrado até então na preocupação de "como e o que ensinar" – demonstrando a importância de entendermos como o aluno constrói o conhecimento.
A construção do conhecimento é entendida a partir daí, como uma experiência individual, com um tempo próprio de cada um, mas efetivada no coletivo, através das relações aluno-professor e aluno-aluno.
Nesta perspectiva o papel do professor muda para aquele que planeja, organiza e orienta as experiências do aluno, a partir de suas respostas e comportamentos, media o processo, estimula e apresenta desafios, e avalia a aprendizagem considerando cada avanço,
cada progresso apresentado em todos os aspectos do desenvolvimento. Concordamos com Marchesi (2004) quando afirma que ". as dificuldades e os transtornos dos alunos não são independentes das experiências que lhes são proporcionadas em
casa, na escola nem nos suportes que lhes oferecem".
Concluímos que o papel do educador como mediador de todo o processo de aprendizagem, e facilitador na interação da criança com o meio do conhecimento é de fundamental importância.
Vimos em Vygotsky, que quando a criança chega à escola, “já traz no seu desenvolvimento uma história anterior, o que vai indicar a existência de uma relação estreita entre o seu desenvolvimento e um tipo de aprendizagem" (Moreira, Livro Texto 1 – pág. 41). E que o seu desenvolvimento acontece em dois níveis: - o real, que possibilita a criança resolver atividades com independência; - o potencial que possibilita a criança ir além do que é capaz de fazer sozinha, desde que conte com a ajuda, o apoio dos colegas e professora. A escola trabalha então, neste nível com o objetivo de transformá-lo em desenvolvimento real.
Assim, o trabalho educativo com alunos que apresentam um déficit cognitivo acentuado, deve oferecer uma ajuda planejada a partir das habilidades que o educando já desenvolveu, apresentando desafios que o estimulem a crescer e adquirir autonomia de acordo
com suas potencialidades, com o apoio dos colegas e professores.
Torna-se necessário, então, elaborar instrumentos de avaliação com as finalidades de: - diagnosticar conhecimentos, habilidades e atitudes já consolidadas e aquelas que estão em processo de desenvolvimento; - direcionar e/ou redirecionar o trabalho educacional tendo em vistas o atendimento às capacidades e possibilidades de aprendizagem dos alunos;
- oferecer os suportes complementares visando o atendimento das necessidades especiais que o aluno apresenta durante o seu processo de desenvolvimento e aprendizagem.
Neste enfoque, a avaliação estende-se a todos os âmbitos do processo educacional, ou seja, a avaliação não se restringe apenas ao aluno, mas a todo o processo educacional incluindo
os recursos pedagógicos, metodologias, processos didáticos, material suplementar, organização do espaço e dos tempos escolares, e outros.
O papel do professor junto ao orientador educacional e/ou equipe multidisciplinar é imprescindível, pois é ele quem conhece as possibilidades e dificuldades apresentadas pelos alunos no cotidiano escolar, e desenvolve o trabalho de intervenções pedagógicas na sala de aula. Ao considerarmos os processos de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos com graves comprometimentos sócio-cognitivos, podemos nos referenciar na definição de deficiência mental proposta pela AAMR (Sistema 2002), que destaca o aspecto de desenvolvimento global do indivíduo, levando em conta seu contexto social, as características interativas do sujeito com o seu meio ambiente. O importante é que esta definição leva em consideração o desempenho e autonomia do indivíduo em seu contexto de vida escolar, familiar, social, como também aponta os suportes e apoios indispensáveis ao seu desenvolvimento. Isto muda o foco das impossibilidades para as possibilidades do aluno, além de indicar os recursos necessários para desenvolvê-las. Importa, nesse caso, conhecer o comportamento adaptativo do aluno, o seu ajuste ao meio no qual vive; definir o que ele é capaz de fazer sozinho, de fazer com ajuda, e o que ainda não consegue fazer. O teste de inteligência, quando possível, pode complementar a avaliação, mas não se torna o seu instrumento principal, e nem deverá ser utilizado para estigmatizar o aluno. Alguma áreas são importantes de ser pesquisadas para o planejamento dos apoios necessários ao desenvolvimento do educando:
Área pessoal, familiar, social:
- história de vida do aluno;
- condições físicas atuais;
- condições familiares;
- exames e diagnósticos anteriores;
- grau de independência em hábitos de cuidados pessoais, como alimentar-se, vestir-se, e a higiene pessoal;
- desempenho frente às atividades domésticas;
- convivência e interação com os familiares, vizinhos e colegas;
- grau de independência no trânsito em sua escola, rua, bairro, cidade;
- competências sociais adquiridas como: padrões de conduta socialmente aceitos, com
todas as regras que esta convivência exige.
Área escolar do aluno:
- percurso escolar;
- desempenho frente às atividades propostas em sala de aula;
- interesses e habilidades demonstrados em atividades escolares;
- convivência com os colegas e professores;
- conduta em sala de aula e atividades extra-classe.
Área de atendimento ao aluno:
- condições de acessibilidade a todo o espaço físico da escola;
- necessidade de adaptações no mobiliário escolar;
- necessidade de recursos pedagógicos especiais;
- necessidade de metodologia específica para acesso ao currículo.
Esses dados, e outros que se apresentarem importantes, deverão direcionar o plano de desenvolvimento pedagógico a ser elaborado pela equipe, assim como direcionar as adaptações metodológicas, indicar os apoios e recursos necessários ao acesso do aluno ao
currículo escolar. Enfim, o plano pedagógico deverá apontar para estratégias que permitam o crescimento e desenvolvimento do aluno no nível pessoal, cognitivo, relacional e emocional. A avaliação, sendo processual, deverá levar em conta todos os avanços que o aluno apresentar durante o processo de aprendizagem, assim como as mediações necessárias para o seu desenvolvimento. Enfim, o centro do processo escolar é o aluno, e todo o contexto escolar deve estar
voltado para o atendimento às necessidades que se apresentarem durante o seu processo de aprendizagem. Por fim, ressalta-se que esta perspectiva de avaliação aplica-se, não só aos casos de
alunos que apresentam graves comprometimentos cognitivos, mas também aos casos de alunos portadores de outras necessidades educacionais especiais e, de igual maneira aos alunos em situação de dificuldade de aprendizagem, cujas causas nem sempre são claramente identificáveis.


Bibliografia:

BASSEDAS et al, Intervenção educativa e diagnóstico psicopedagógico. 3ª dição. Porto Alegre: Editora Artes Médicas. 1996.
COLL, Marchesi & colaboradores. Desenvolvimento Psicológico e Educação. Transtornos de desenvolvimento e necessidades educativas especiais. 2ª edição. Porto Alegre: Artmed, 2004.
AAMR: American Association on Mental Retardation. Retardo mental: definição,
classificação e sistemas de apoio. Tradutora: Magda França Lopes - Porto Alegre – Artmed. 2006 MEC/SEF/SEESP. Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares/ Estratégias para a Educação de Alunos com Necessidades Educacionais Especiais. Brasília:MEC, Secretaria de Educação Fundamental, Secretaria de Educação Especial,